Este texto não é uma ficção.

Nada prepara a gente para ter uma arma apontada em nossa cara. Na noite da última terça-feira (6.10), tive a experiência in loco e soube, afinal, como reagiria. O sujeito passou por mim minutos antes da abordagem, deve ter me achado um alvo fácil e me seguiu. Minutos depois a arma na cara e um clichê carioca: “perdeu, perdeu”.

(Fui assaltado quatro vezes em minha vida. Em duas, reagi e nada me levaram. Nas outras duas, não me levaram tudo, mas bastante de bens materiais. Não foi por coincidência que essas duas envolveram armas de fogo.

Em 99, era um vestibulando a caminho de casa quando dois homens anunciaram o assalto em um ônibus em movimento. Em 2015, o sujeito tomou o celular de minhas mãos enquanto apontava o cano no meio de meus olhos.)

“Perdeu, perdeu”.

Não sei se a arma era de verdade. Mas a minha vida é de uma verdade absoluta e quase palpável. Desapeguei do celular, comprado em junho.

O assaltante me ordenou a seguir em frente sem olhar para trás. Era o pacto final: desistir do celular e de encará-lo para sair daquele Hades, como Orfeu deveria fazer com Eurídice. Obedeci.

Em toda situação, fiquei calmo. Não reagi e nem fiz movimentos bruscos.

O dia seguinte foi o pior. Sentia culpa, mas não sabia pelo quê. Sentia medo, mas não sabia de quem. E sentia raiva de mim mesmo. Mas não sabia o porquê.

Meu estresse pós-trauma foi um carrossel de emoções.

De tudo o que passou, apenas uma certeza. Não mudei. Não ando mais pelo mesmo caminho à noite*, mas não mudei minhas convicções ou minhas esperanças. Ainda acho que educação resolve mais do que violência. Ainda não consigo acreditar que bandido bom é bandido morto. E nem passei a considerar andar armado.

O assalto só roubou meu celular. Eu continuo bem vivo por aí, com o mesmo olhar de sempre.

Ganhei, parceiro.

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Quem escreve quando não entende bem o que sente, não consegue falar a respeito. Escrever ajuda a gente a entender.

Uma palavra aqui, pensar um pouquinho após a vírgula e, antes do ponto final, entendemos o que houve. E, se Deus quiser, ajuda o leitor a entender alguma coisa que sirva para ele também.

Obrigado por me ler. Eu estava precisando.

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Esta é uma carta-crônica que enviei há alguns dias, sobre um assalto que sofri. Você pode assinar para receber textos como esse nesta página.

*PS: Evite a rua General Canabarro, próxima ao Maracanã, no horário da noite. A abordagem ocorreu por lá. E, caso você use Android, procure saber o número de IMEI do seu aparelho para inutilizá-lo em caso de roubo.

escrito por tcordeiro
Meu nome é Tiago Cordeiro e trabalho com conteúdo (textos, roteiro, ficção e não ficção) e digital. Atualmente, sou roteirista e sócio da Scriptograma.

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